sábado, 8 de agosto de 2015

OITO DE AGOSTO

Bart hoje, feliz depois de devorar um prato especial

Durante um longo tempo, desde meus doze anos, o dia 8 de agosto foi uma data triste para mim.  O dia que meu pai morreu.

Todos os meses, no dia 8, era marcada uma missa, em que o nome dele era lembrado, e o padre pedia paz para sua alma. Eu detestava aquelas missas, mais ou menos como detesto todas as missas até hoje.

Mas não é para falar de missa que escrevo. Não me importam as missas.

Muito depois, eu já com uns vinte e poucos, o 8 de agosto passou a ser uma data a se celebrar. Era aniversário de um namorado de quem gostei muito. E assim, era dia de festa, de jantares e brindes, flores na casa, presentes e um monte de beijos.

O namoro acabou um dia. Os namoros acabam, aprendi isso. Os amores mudam.

E, em 2003, o 8 de agosto passou a ser um dia mais que especial, marcado por uma alegria incrível.

Recebemos uma ligação de um amigo, dizendo que a cachorrinha tinha tido seis filhotes, um machinho seria nosso. O Bart nasceu, vibrei. Ele sempre se chamou Bart, desde que o amigo disse que a mãezinha tinha ficado prenha. Minha primeira reação, depois de pular como uma criança, foi comprar uma bolinha, com a qual ele brinca até hoje, pratinhos de água e de comida, uma caminha e uma manta. Pronto, o enxoval completo para recebe-lo.

Mas havia que esperar o desmame. Foram alguns dos quarenta e cinco dias mais longos da vida. E finalmente, em meados de setembro, fomos à casa onde ele nasceu, em Jacarepaguá.  Bart nos foi apresentado, ainda com o nome de Pateta, dado pela família que o mimou nos primeiros dias.  Era uma minhoquinha pequena, do tamanho de um pé, patas muito curtas, as unhas pretas finas que arranhavam a pele, o pelo macio com falhas atrás das orelhas, o rabo esticado, o andar descoordenado dos filhotes. Frágil, se atrapalhava para sugar os restos de leite da mãe, que perdia a paciência, dava patadas, o afastava, ele e aos outros filhotes, de suas tetas doloridas. Chega, quer gritar, vão ser gauche na vida. Mas não gritava, não podia fazer isso, era só uma cadela gorda e rosnava e mostrava os dentes. Estava cansada daqueles seis, queria sua boa vida de volta, dormir sob o sol ao pé da árvore, correr pelo gramado, deitar de barriga para cima.

Eu o peguei no colo, cheirei sua cabecinha, acariciei sua barriga rosada, o elevei à altura do rosto e beijei seu peito em forma de barril.

Bart no dia que chegou em casa


No caminho para sua nova casa, o bichinho chorou em meu colo, enrolado na manta. Em três dias já tinha conquistado seus espaços, se divertia com caixas de papelão, corria descoordenado pela sala. Um dia, cheirou uma tomada e levou um choque no focinho molhado. Ficou tão assustado que se refugiou no box. De uma outra vez, morreu de medo do guarda-chuva aberto. Como aquele bicho magro pode ficar tão grande, era a pergunta que fazia.

Há doze anos é meu companheiro inseparável e a gente se comunica só pelo olhar. Eu entendo tudo o que ele quer: a água de coco que ele pensa brotar da geladeira, a banana, a hora dos palitos comestíveis. Ele entende tudo o que eu quero: uma lambida de carinho, um abraço, que deite na minha perna enquanto vemos televisão. E todos os anos, no dia 8 de agosto, ele ganha o prato preferido: arroz com frango desfiado e cenoura. Faz plantão na frente do fogão, chorando baixinho, enquanto a comida é preparada. O choro se transforma em uivo até o regabofe esfriar.  Acabou de comer, está satisfeito. Agora parte para o sono da tarde.

Frango com arroz e cenoura, prato favorito do Bart


Ao Bart, o George Clooney dos cachorros, o  grisalho mais charmoso do mundo,  que ainda destrói almofadas como um psicopata – o Bart, o George eu não sei --  um aniversário mais que feliz, e mais alguns anos pela frente, porque te amo demais. E esse amor não muda nunca.


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